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- Deus e negócios - 25/7/2001 Revista EXAME Dá
para misturar espiritualidade e riqueza? A consultora americana diz que sim. E
que isso é bom e ajuda a melhorar a motivação e a produtividade nas empresas Por
Suzana Naiditch No
livro QS - Inteligência Espiritual, lançado no ano passado, a física e filósofa
americana Dana Zohar aborda um tema tão novo quanto polêmico: a existência de
um terceiro tipo de inteligência que aumenta os horizontes das pessoas,
torna-as mais criativas e se manifesta em sua necessidade de encontrar um
significado para a vida. Ela baseia seu trabalho sobre Quociente Espiritual (QS)
em pesquisas só há pouco divulgadas de cientistas de várias partes do mundo
que descobriram o que está sendo chamado "Ponto de Deus" no cérebro,
uma área que seria responsável pelas experiências espirituais das pessoas. O
assunto é tão atual que foi abordado em recentes reportagens de capa pelas
revistas americanas Neewsweek e Fortune. Afirma Dana: "A inteligência
espiritual coletiva é baixa na sociedade moderna. Vivemos em uma cultura
espiritualmente estúpida, mas podemos agir para elevar nosso quociente
espiritual". Aos
57 anos, Dana vive na Inglaterra com o marido, o psiquiatra Ian Marshall,
co-autor do livro, e com dois filhos adolescentes. Formada em física pela
Universidade Harvard, com pós-graduação no Massachusetts Institute of
Tecnology (MIT), ela atualmente leciona na universidade inglesa de Oxford. É
autora de outros oito livros, entre eles, O Ser Quântico e A Sociedade Quântica,
já traduzidos para o português. QS - Inteligência Espiritual já foi editado
em 27 idiomas, incluindo o português (no Brasil, pela Record). Dana tem sido
procurada por grandes companhias interessadas em desenvolver o quociente
espiritual de seus funcionários e dar mais sentido ao seu trabalho. Ela falou a
EXAME em Porto Alegre durante o 300 Congresso Mundial de Treinamento e
Desenvolvimento da International Federation of Training and Development
Organization (IFTDO), organização fundada na Suíça, em 1971, que representa
1 milhão de especialistas em treinamento em todo o mundo. Eis os principais
trechos da entrevista: O
que é inteligência espiritual? É
uma terceira inteligência, que coloca nossos atos e experiências num contexto
mais amplo de sentido e valor, tornando-os mais efetivos. Ter alto quociente
espiritual (QS) implica ser capaz de usar o espiritual para ter uma vida mais
rica e mais cheia de sentido, adequado senso de finalidade e direção pessoal.
O QS aumenta nossos horizontes e nos torna mais criativos. É uma inteligência
que nos impulsiona. É com ela que abordamos e solucionamos problemas de sentido
e valor. O QS está ligado à necessidade humana de ter propósito na vida. É
ele que usamos para desenvolver valores éticos e crenças que vão nortear
nossas ações. Há
quanto tempo a senhora trabalha com inteligência espiritual? Toda
a minha vida, praticamente, já que perdi a fé na religião (cristianismo) aos
11 anos de idade e sempre procurei um meio de encontrar realização espiritual
fora dos domínios da religião. Meu trabalho mais recente sobre QS tem quatro
anos e foi produzido ao mesmo tempo em que cientistas começaram a divulgar
pesquisas que mostram uma base neurológica para as experiências espirituais e
místicas. De
que modo essas pesquisas confirmam suas idéias sobre a terceira inteligência? Os
cientistas descobriram que temos um "Ponto de Deus" no cérebro, uma
área nos lobos temporais que nos faz buscar um significado e valores para
nossas vidas. É uma área ligada à experiência espiritual. Tudo que
influencia a inteligência passa pelo cérebro e seus prolongamentos neurais. Um
tipo de organização neural permite ao homem realizar um pensamento racional, lógico.
Dá a ele seu QI, ou inteligência intelectual. Outro tipo permite realizar o
pensamento associativo, afetado por hábitos, reconhecedor de padrões, emotivo.
É o responsável pelo QE, ou inteligência emocional. Um terceiro tipo permite
o pensamento criativo, capaz de insights, formulador e revogador de regras. É o
pensamento com que se formulam e se transformam os tipos anteriores de
pensamento. Esse tipo lhe dá o QS, ou inteligência espiritual. Qual
a diferença entre QE e QS? É
o poder transformador. A inteligência emocional me permite julgar em que situação
eu me encontro e me comportar apropriadamente dentro dos limites da situação.
A inteligência espiritual me permite perguntar se quero estar nessa situação
particular. Implica trabalhar com os limites da situação. Daniel Goleman, o teórico
do Quociente Emocional, fala das emoções. Inteligência espiritual fala da
alma. O quociente espiritual tem a ver com o que algo significa para mim, e não
apenas como as coisas afetam minha emoção e como eu reajo a isso. A
espiritualidade sempre esteve presente na história da humanidade. Por
que somente agora o mundo corporativo se preocupa com isso? O
mundo dos negócios atravessa uma crise de sustentabilidade. Suas atitudes e práticas
atuais, centradas apenas em dinheiro, estão devastando o meio ambiente,
consumindo recursos finitos, criando desigualdade global, conduzindo a uma crise
de liderança nas empresas e destruindo a saúde e o moral das pessoas que
trabalham ou cujas vidas são afetadas por elas. Espiritualidade nos negócios
significa simplesmente trabalhar com um sentido mais profundo de significado e
propósito na comunidade e no mundo, tendo uma perspectiva mais ampla,
inspirando seus funcionários. Nós não sabemos mais o que é realmente a vida.
Não sabemos qual é o jogo que jogamos nem quais são as regras. Falta-nos um
sentido profundo de objetivos e valores fundamentais. Essa crise de significado
é a causa principal do estresse na vida moderna e também das doenças. A busca
de sentido é a principal motivação do homem. Quando essa necessidade deixa de
ser satisfeita, a vida nos parece vazia. No mundo moderno, a maioria das pessoas
não está atendendo a essa necessidade. Como
se pode detectar os sintomas dessa crise na vida corporativa? Desde
o surgimento do capitalismo, há 200 anos, tudo que importa no mundo dos negócios
é o lucro imediato. Isso criou uma cultura corporativa destituída de
significado e de valores mais profundos. Nós apenas queremos mais dinheiro. Mas
para quê? Para quem? Trabalhamos para consumir. É uma vida sem sentido. Isso
afeta o moral, tanto dos dirigentes quanto dos empregados, sua produtividade e
criatividade. E também afasta dos negócios preocupações mais amplas com o
meio ambiente, a comunidade, o planeta e a sustentabilidade. O mundo corporativo
é um monstro que se autodestrói porque lhe falta uma estrutura mais ampla de
significado, valores e propósitos fundamentais. Há uma profunda relação
entre a crise da sociedade moderna e o baixo desenvolvimento da nossa inteligência
espiritual. Quais
companhias a têm chamado para desenvolver trabalhos que busquem elevar o
quociente espiritual de dirigentes e empregados? Não
posso citar seus nomes, mas tenho atendido a bancos, financeiras, empresas de
telecomunicações, de petróleo e montadoras de automóveis. Trabalhamos juntos
para adquirir a compreensão de que as atitudes e práticas existentes são
insustentáveis e como as empresas podem desenvolver tanto a sustentabilidade
como os serviços cultivando as dez qualidades do quociente espiritual (veja
quadro na pág. 79) A
senhora poderia citar exemplos de companhias ou empresários que estejam
buscando mais sentido em seu trabalho? Há
muitos exemplos. Mats Lederhausen, o vice-presidente de estratégia global do
McDonald's, é um deles. Sua função na empresa é ser a voz de protesto e
consciência, sacudindo as pessoas, agitando o barco. Ele iniciou projetos como
a distribuição gratuita de vacinas antipólio na África, a luta contra plantações
geneticamente modificadas, o uso de gaiolas maiores para galinhas e um trabalho
para restaurar ecossistemas danificados. Outro
exemplo é a Amul, empresa da Índia que distribui para o Estado de Gujarat o
leite de 10 000 cooperativas. A Amul compra todos os dias o leite de camponeses
que possuem apenas uma vaca, permitindo que indivíduos pobres possam competir
com grandes fazendeiros. O Banco de Desenvolvimento da Ásia se dedica à
erradicação da pobreza com programas de micro-crédito para pessoas muito
pobres. A
British Petroleum adotou um novo slogan, "Além do Petróleo", e está
colocando o grosso de seus fundos de pesquisa no desenvolvimento de tecnologias
energéticas alternativas, menos agressivas ao meio ambiente. John Browne, o CEO
da companhia, conseguiu aumentar o valor das ações enfatizando relações de
longo prazo entre sua empresa e a sociedade. Como
é o líder espiritualmente inteligente? É
um líder inspirado pelo desejo de servir, uma pessoa responsável por trazer
visão e valores mais altos aos demais e por lhes mostrar como usá-los. É uma
pessoa que inspira as outras. Gente como o Dalai Lama, Nelson Mandela, Mahatma
Gandhi. No mundo dos negócios, Richard Branson, da Virgin, é um líder
espiritualmente inteligente. Ele está muito preocupado com o meio ambiente e a
comunidade. É muito espontâneo, tem visão e valores, tem perspectivas amplas.
Como
se pode desenvolver a inteligência espiritual? Tomando
consciência das dez qualidades comuns às pessoas espiritualmente inteligentes
e trabalhando para desenvolvê-las. Procurando mais o porquê e as conexões
entre as coisas, trazendo para a superfície as suposições que fazemos sobre o
sentido delas, tornando-nos mais reflexivos, assumindo responsabilidades, sendo
honestos conosco mesmos e mais corajosos. Tornado-nos conscientes de onde
estamos, quais são nossas motivações mais profundas. Identificando e
eliminando obstáculos. Examinando as numerosas possibilidades,
comprometendo-nos com um caminho e permanecendo conscientes de que são muitos
os caminhos. De
que forma as pessoas espiritualmente inteligentes podem beneficiar as corporações?
As
pessoas com QS elevado querem sempre fazer mais do que se espera delas. Algo
para além da empresa. Quem trabalha unicamente por dinheiro não faz o melhor
que pode. Nas empresas em que se busca desenvolver espiritualmente os funcionários,
a produtividade aumenta porque eles ficam mais motivados, mais criativos e menos
estressados. As pessoas dão tudo de si quando se procura um objetivo mais
elevado. Se as organizações derem espaço para as pessoas fazerem algo mais,
se souberem desenvolver em cada indivíduo sua inteligência espiritual, terão
mais resultados e mais rapidamente. A
senhora diz que o capitalismo como se conhece hoje está com os dias contados,
mas que um novo capitalismo está nascendo. Como ficam as empresas com essa
nova perspectiva? Está
surgindo um novo tipo de empresa. É uma empresa responsável. No novo
capitalismo sobreviverão as companhias que têm visão de longo prazo, que se
preocupam com o planeta, em desenvolver as pessoas que nelas trabalham. Que se
preocupam, sim, com o lucro, mas que querem ganhar dinheiro para desenvolver as
comunidades em que atuam, proteger o meio ambiente, propagar educação e saúde.
Você
é espiritualmente Inteligente? Conheça
as dez qualidades essenciais de quem chegou lá No
início do século 20, o QI era a medida definitiva da inteligência humana. Só
em meados da década de 90, a descoberta da inteligência emocional mostrou que
não bastava o sujeito ser um gênio se não soubesse lidar com as emoções. A
ciência começa o novo milênio com descobertas que apontam para um terceiro
quociente, o da inteligência espiritual. Ela nos ajudaria a lidar com questões
essenciais e pode ser a chave para uma nova era no mundo dos negócios. Dana
Zohar identificou dez qualidades comuns às pessoas espiritualmente
inteligentes. Segundo ela, essas pessoas: 1.
Praticam e estimulam o autoconhecimento profundo 2.
São levadas por valores. São idealistas 3.
Têm capacidade de encarar e utilizar a adversidade 4.
São holísticas 5.
Celebram a diversidade 6.
Têm independência 7.
Perguntam sempre "por quê?" 8.
Têm capacidade de colocar as coisas num contexto mais amplo 9.
Têm espontaneidade 10.
Têm compaixão |
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