Uma Pessoa Melhor, um Executivo Melhor

Kenn Allen, especialista em voluntariado corporativo, conta como o envolvimento em causas sociais pode influenciar a carreira e os negócios

 

Nos anos 60, Kenn Allen era um desmotivado estudante de ciências políticas na Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. Estava meio perdido, como tantos outros jovens de sua geração. Allen poderia ter entrado para o movimento hippie, mas preferiu ser voluntário em projetos sociais. Começou e não parou mais. Hoje, aos 52 anos, ele é uma das maiores autoridades mundiais em voluntariado corporativo. Há pouco mais de dois anos, apresentou uma tese de doutorado sobre presidentes de empresas voluntários na George Washington University. Entre os participantes estavam John Akers, ex-presidente mundial da IBM, e Bryan Sanderson, presidente da British Petroleum Chemicals. Como presidente da International Association for Volunteer Effort, participou de projetos em corporações como a Toyota, a AT&T e a American Express. Há algumas semanas, Allen deu uma entrevista à EXAME. A seguir os principais trechos:

EXAME - O senhor realizou um grande estudo com presidentes de empresas que fazem trabalho voluntário. Quais foram suas principais conclusões?

ALLEN - Meu objetivo era saber qual o significado do voluntariado para presidentes de empresas. Dessa forma, selecionei um grupo de executivos com base em dois critérios. O primeiro é que eles realmente fizessem trabalho voluntário. O segundo é que eles falassem comigo. Escolhi cinco presidentes nos Estados Unidos e outros três na Inglaterra. Todos eles disseram que o voluntariado era uma forma de desenvolver a cultura e os valores da empresa. Esses executivos realmente acreditam que esse tipo de envolvimento com a comunidade é bom para os negócios. Eles usam seus exemplos pessoais para transmitir aos funcionários, ao mercado e à sociedade que tipo de atitude aquela empresa tem em relação ao mundo exterior. Particularmente nos Estados Unidos, espera-se que um presidente seja um representante externo da companhia. Participar de trabalhos voluntários é uma forma de fazer isso.

E qual a influência na vida pessoal desses executivos?

Essas pessoas olham para trás e vêem que trabalharam duro a vida toda, que se esforçaram para subir, subir, subir até atingir a presidência de uma organização. Quando chegam lá, dizem: E agora? Eles procuram uma satisfação pessoal, fora do trabalho. Isso acontece muito com os profissionais que chegam à terceira idade. Eles chegam aos 50, aos 60 anos e começam a pensar nas coisas importantes da vida, em deixar legados. Querem algo além do sucesso nos negócios e na carreira. Muitos desses executivos se tornam voluntários motivados por uma circunstância pessoal. Dois dos três filhos de Dick Munro, presidente do comitê executivo da Time Warner, são portadores de diabetes infantil. Ele e sua mulher se tornaram voluntários muito ativos de uma organização nacional que faz pesquisas sobre essa doença. Bryan Sanderson, presidente da British Petroleum Chemicals, tem uma filha excepcional. Por isso, ele resolveu se envolver com uma entidade que pesquisa esse tipo de problema. Não importa o quanto essas pessoas sejam ricas ou poderosas. Elas continuam sendo pessoas. Têm problemas. Chegam em casa e brigam com a mulher, se preocupam com as crianças... Fazem coisas que qualquer pessoa faz. E buscam satisfação pessoal. Lodwrick Cook, ex-presidente do conselho e principal executivo da Arco, me falava do sucesso que tinha obtido no mundo dos negócios. Então, parou e disse: "Eu não teria conseguido tudo isso se não tivesse me tornado voluntário. Graças a isso, me tornei uma pessoa melhor e um presidente melhor".

Essa é só uma questão pessoal?

Quase todos os executivos consultados disseram que a corporação estimulava esse tipo de atuação. O trabalho voluntário já era uma tradição dentro dessas companhias. A Time Warner e a IBM, por exemplo, têm uma tradição de apoio às comunidades que vem de seus fundadores. Elas esperam que seus executivos dêem prosseguimento a essa tradição. Funcionários só terão envolvimento comunitário se a cultura da empresa estimular isso.

Qual o relato que o impressionou mais?

Eu acho que foi o de Cook, da Arco. Ele nasceu numa cidadezinha da Louisiana. É um estado pobre, onde havia muita segregação racial. Cook cresceu nessa atmosfera de preconceito, mas sua família sempre esteve envolvida com a comunidade e manteve valores muito positivos. Ao longo do tempo, ele foi se afastando do trabalho comunitário. Estava mais ocupado com seu desenvolvimento, a carreira, o trabalho, a rotina. Foi assim até que alguém na companhia dissesse que ele precisaria fazer mais, que ele tinha uma obrigação para com a comunidade. Não é fácil ser presidente e voluntário ao mesmo tempo. Mas Cook entendeu que se envolver com o mundo a seu redor iria beneficiá-lo também como profissional. Na época da entrevista, Cook estava prestes a se aposentar. Ele estava tranqüilo porque sabia que o voluntariado iria preencher um espaço importante em sua vida dali em diante.

Qual a importância do voluntariado corporativo?

Primeiro, ele é bom para a comunidade. Os funcionários das corporações costumam ser grandes voluntários, porque têm habilidades especiais para gerenciar projetos comunitários. Os funcionários também são beneficiados. Eles têm a oportunidade de desenvolver novas habilidades. Como voluntários, os funcionários de uma corporação desenvolvem atividades bem diferentes daquelas exercidas no trabalho. Isso é bom para as empresas. As corporações não ganham nada com funcionários aborrecidos, desmotivados. Freqüentemente, se desenvolvem novas lideranças e se descobrem novos aspectos das comunidades, das pessoas e do mercado. Com o voluntariado, as empresas terão funcionários melhores, mais motivados, com mais auto-estima. Muitos presidentes usam o voluntariado como um dos critérios para o recrutamento de talentos. E finalmente: fazendo da comunidade um lugar melhor para se viver, você terá um lugar melhor para fazer negócios. Uma comunidade saudável é um lugar melhor para vender seus produtos, para instalar seu escritório. Num lugar assim, suas chances de sucesso certamente serão maiores.